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POROMONGUETÁ: A TRAJETÓRIA DA LÍNGUA DO POVO TREMEMBÉ



Mbo’esara Esãîã Tremembé
Antropólogo


O presente artigo trata da trajetória do Poromonguetá, outrora falado pelo povo Tremembé, que por razões históricas, políticas e culturais foram substituído pela língua dominante, a língua portuguesa. Para isso, far-se-á o percurso feito por antropólogos, linguistas e principalmente, historiadores, dos quais, procuraremos compreender a situação monolíngue atual dos Tremembé da costa do Ceará.

Palavras-chave: Poromonguetá; História; Tremembé; linguística.

Ceará 1629


CONTEXTO HISTÓRICO

Quando nos remetemos a trajetória histórica dos povos indígenas nos deparamos com um quadro bastante trágico que nos remetem as atrocidades de vários níveis, de genocídio ao etnocídios, de escravidão a massacres, guerras, transmissões de doenças, dentre tantos males que assolaram as populações indígenas durante este período da história. Estimativas apontam que durante o período pré-cabraliano existiam no Brasil cerca de 3 a 5 milhões de indígenas, número assustadoramente impactante quando comparado com os 0,4% encontrados hoje na sociedade brasileira, segundo apontamentos realizados pelo IBGE (2001).
Dentro do percurso, podemos apontar categoricamente, que as embarcações portuguesas chegaram ao Brasil por volta de 1500 e, somente após trinta anos, por volta de 1530 é que teve de fato início a colonização territorial da costa brasileiro. Transcorridos 19 anos é que se iniciou o processo de catequização que ficou a encargos dos jesuítas que chegaram em 1594. Com objetivos bastantes definidos, a saber, a expansão da fé católica, abririam margens sólidas para o fortalecimento da coroa portuguesas em terras de “bárbaros e gentis”. A colonização teve impasses de grupos indígenas aliados, por exemplo, a outras coroas como a holandesa e espanhola. Essa aliança e a resistência a catequese fizeram que alguns grupos indígenas ficassem fora da ação catequética dos jesuítas e outras congregações religiosas posteriormente, (carmelitas e franciscanos, por exemplo) o que contribuiu para a não documentação linguística (a maior parte da literatura das línguas brasílicas são de cunho religioso) ficando a mercê de contextos citacional, como Mamiani, citando os teremembés em 1694 em sua introdução ao Catecismo na Língua Kiriri.
A expansão dos dialetos Tupi, adotado pelos redutos missionários como língua de comunicação e evangelização, contribuiu para a homogeneização da língua falada na costa brasileira. Assim, os grupos minoritários, já que os falantes dialetais do tupi estavam praticamente em toda costa brasileira, passaram a ser considerados alvos de rechaças, bem como mostras Seky a preferência pela língua costeira,

As demais línguas, faladas por povos genericamente considerados como constituindo o grupo “tapúya” (tupi: ‘bárbaro, inimigo’), eram denominadas de “travadas”, de difícil entendimento, em contraste com o tupi jesuítico, o “nheengatu” (tupi: nhe’eng ‘língua’ + katu ‘bom’) a “língua boa’. Este último desenvolveu- se como ‘língua geral’ da colônia e ainda hoje sobrevive na região do Rio Negro. (SEKY, p253)


Entre os diversos grupos indígenas que puseram residência a coroa portuguesa encontramos o grupo étnico dos Tremembé.  Primeiramente, a terra ao norte costeiro (nordeste) brasileiro era inapropriada a produção e ao cultivo, diferentemente, da capitania de Pernambuco que prosperava com o cultivo da cana de açúcar, e com a resistência a ação dos missionários, os Tremembé foram ficando cada vez mais arredios e colocados de lado da politica administrativa da coroa portuguesa. O que aconteceu aos Tremembé pode ser entendido nas palavras de Barros:

Esta política de institucionalização de uma língua indígena como geral foi parte de uma política indigenista colonial que estabeleceu uma categoria de “índio”, que não existia no mundo pré-colonial. Índio era uma categoria superétnica, reduzidas as diferenças dos grupos a um modelo único aplicado a toda a população indígena. A categoria índio marcava a oposição entre o colonizador e o colonizado. Mantinha a alteridade cultural em relação ao colonizador, porém sem recuperar o étnico, ou seja, as especificidades próprias de cada grupo como unidade político-econômica”. (BARROS et al, 1996, p. 195-6)

            Foi praticamente neste período que os Tremembé fizeram uma aproximação da “Língua Boa” levado pelos viajantes que apontavam nesta região costeira do país. No livro Camocim Centenário 1879-1979, onde se narra a história de Camocim/CE, o historiador Tobis de Melo Monteiro, aponta uma aproximação holandesa passiva com a população indígena (Tremembé) dessa região. Ai se realizou não somente uma troca material de objetos, mas também gerou alianças bélicas e matrimoniais. Holandeses e espanhóis já tinham conhecimento das línguas indígenas da costa brasileira levadas pelos missionários, como atenta os exemplares na bibliografia española de Lenguas indígenas de América do Conde de La Viñaza (1892) em Madri, não só conhecia como também tinha fluências devido o contato e o esforço jesuítico de propagar a língua mais falada na costa brasileira como bem apontou Pe. Anchieta. Em síntese, a Língua Geral passou a ser a única língua de contato entre eles e os indígenas costeiros, mesmo não sendo falantes do tronco tupi, como era o caso dos Tremembé que habitavam a região anterior aos tupinambás ou qualquer outro grupo tupi,

Antes da chegada dos colonizadores, os Tremembé ocupavam todo o litoral, desde o Rio Grande do Norte até o Maranhão. Há, pelo menos, 11 mil anos, diferentes povos viviam nessas terras, seguindo seus costumes e tradições. (COMIN, 2004)

            Os contatos intermitentes com os espanhóis e holandeses e as alianças forjadas com eles, abriu-se uma frente de embate com a coroa portuguesas, aliadas dos falantes do tronco tupi. Neste período já era possível verificar entendimento dos Tremembé de uma vertente da língua tupi falada na região do Maranhão, onde se encontrava parte mais densa do povo Tremembé. No intuito de reduzir o território habitado pelos Tremembé, agora falantes de uma vertente do tupi (poromonguetá) e com uma população mestiça aumentando na região maranhense, começaram os embates. A coroa portuguesa receosa de perder território para os holandês (que já dominava parte das capitanias do Nordeste liderado então por Jacob Rabbi e Roulox Baro) decidiu utilizar uma tática, oferecer sesmarias para acelerar o desterritoriamento da região, já que não tinha contingente militar suficiente no Brasil para o empreito, assim,

A partir de 1679, os conflitos aumentaram, pois a coroa portuguesa doou lotes de terra (sesmarias) a brancos que quisessem disputá-los com os índios. Essa ação provocou uma guerra que durou mais de 50 anos. (COMIN, 2004, p.04)

Pe. Luiz V. Mamiani, que trabalhou com os Kiriri aponta em sua obra um suposto “aparentado” dos Tremembé com o povo da nação Kiriri [1], fato observado pela comunicação do poromguetá falado pelos Tremembé. Como era uma comunicação bastante insuficiente, pois os Kariri pertencem, como se sabe hoje, ao Tronco Macro Gê, já possuíam em seu léxico muitas palavras oriundas do tupinambá devido a catequese forçada aos “tapuya”, ou seja, ao falantes de língua travadas. Ambos, Kiriri e Tremembé não faziam parte do tronco Tupi, o que os aproximavam geograficamente, mas não linguisticamente (até o momento em que os Tremembé deixavam de falar sua língua materna e passavam a adotar o poromonguetá[2], já falado pelos filhos da aliança anteriormente postulado com os espanhóis e, principalmente, com holandeses). A estes aspectos citado acima e aos fatores das estratégias da coroa portuguesa Mamiani coloca,

Após a conquista resulta certo que somente os Teremembés aparentados próximos dos Quiriris, ocuparam maior trecho da Costa, de que fizeram mau uso, e foram por isso impiedosamente castigados em 1679 pelo mamaluco Vital Maciel Parente, de ordem do Governador do Maranhão Inácio Coelho da Silva. (MAMIANI, 1942, XX) [grifo nosso]

            Com a expulsão dos holandeses do nordeste e o extermínio de alguns grupos indígenas que formaram alianças até o fim com invasores europeus e a aquisição da Língua Geral (denominada então de poromonguetá[3]) pelos Tremembé, foi crucial a compreensão do que se sucedeu com os Tremembé com outros grupos indígenas dessa região do Brasil colonial. É um fato histórico que houve preeminência da língua boa. Prova indubitável dessa nova aquisição é a presença marcante do poromonguetá na toponímia da região costeira do Ceará, dos quais podemos citar, Camocim, tatajuba, Preá, Jericoacoara, Itarema, acaraú, jijoca, etc. essa região habitada deveras a muito tempo não recebeu nomes das línguas indígenas faladas do tronco Jê. Já que o era o mais esperado, e sim do poromonguetá.
Prosseguindo com o arcabouço histórico podemos perceber que nos séculos XVI e XVII, os Tremembé ocupavam a extensa região litorânea que segue do atual Pará ao Ceará[4]. Com a colonização portuguesa, aldeamentos missionários foram criados, destacando-se o de Tutóia (Maranhão), controlado pelos jesuítas, e o do Aracati-mirím (Ceará), que era controlado por padres seculares. A criação da Missão do Aracati-mirím ocorreu muito provavelmente no século XVIII. É de conhecimento histórico que algumas sesmarias foram doadas aos religiosos, e mais especificamente aos padres seculares, na região próxima à Missão entre 1724 e 1744. A aproximação geográfica entre os tapuyas e os Tremembé era de tal forma inevitável e constante (pelo de se comunicarem através do poromonguetá) que alguns registros chegam a se referirem às terras aldeadas como Missam do tapuya Tramanbe. Esse empreendimento teve tão grande impacto na vida social dos Tremembé que depois passou a ser chamada de Missão de Nossa Senhora da Conceição dos Tramambés. Entretanto, não foram só as missões responsáveis pela difusão da língua geral, com a tomada das terras da nova política da coroa portuguesa, os Tremembé queria de alguma forma garantir a posse da territorialidade de um lado e os colonizadores, agora fixos na nova região, queriam terra para a criação de cabeças de gado. Desta forma, por volta de 1750, houve um mudança nos padrões da politica imperial, os Tremembé, como também de outras etnias, se sentiram forçados a se misturar com os brancos (bem como também com os negros) para segura-lhes a faixa litorânea. Além disso, a nova realidade que revestia o Brasil travou suas garras na dimensão linguística, impedindo os indígenas de falarem suas línguas, bem como se iniciou o processo de incorporação dos bens pela então instituída lei administrativa. Em 1863, não acreditando que as medidas cautelares da língua e dos bens fossem surtir efeito o Governo Provincial tentou extinguir os indígenas do nordeste por decreto (COMIN, 2004, p.04).

A LÍNGUA DO POVO TREMEMBÉ

Sabe-se que não há vestígios documentais da nossa língua, outrora falada pelo povo Tremembé. Em outras palavras, perdeu-se historicamente a dimensão nativa da língua materna, mas podemos te acesso a sua trajetória histórica de forma indireta,

Pouco se sabe a respeito da língua dos Tremembé. Através das suas canções e das suas danças, encontramos palavras que nos dão a noção de como essa língua é bela. (semana dos povos indígenas/ceará, 2004,p)

Um estudo mais detalhado, como estou realizando[5], sobre as letras do Torém e uma convivência com caboco velho, como diz meu avô, me levou a procurar reconstituir aquilo que teria sido um dia a nossa língua. O Torém é a maior manifestação da cultura Tremembé e que passou por um processo de desmitificação e desfolclorização como bem demostrou Valle (2005) em um artigo para a revista Anthropologicas;

A partir de 1940, inicia-se uma leva de pesquisas e estudos folclóricos, etnológicos e históricos sobre os Tremembé e o torém (Pompeu Sobrinho 1951, Seraine 1955, Novo 1976). A maioria dos pesquisadores tratou a dança por um viés típico da “etnologia das perdas” (Oliveira Filho 1999). Era definida como folguedo ou dança folclórica organizada por caboclos ou descendentes de índios.

Cito Valle (2005) nas mediações do processo de aceitamento reflexivo de um dado cultural novo como componente diacrítico de um grupo étnico, é e sempre será motivos para amputamento sociocultural do material “inventado”. Mas, concordando com Valle quando aponta que,

De fato, muitos elementos da tradição podem ser de criação ou incorporação recente, alguns até mesmo sendo tomados de ‘empréstimo’ de outras origens culturais. Como as identidades, as tradições são contextuais e fluídas, nem o simples acúmulo do passado e nem dependentes de uma fonte exclusiva de autenticidade. Seu caráter singular está fortemente assentado na ação presente dos atores e grupos sociais, que redefinem e remodelam formas culturais, algumas já conhecidas, outras produzidas por eles mesmos. Assim, muitas manifestações, que não eram vistas como tradição, passam a sê-lo a partir de dinâmicas sociais específicas, que podem, inclusive, envolver diversos grupos sociais e agências. (VALLE, 2006, p. 191)

É nesta perspectiva que os dados que apresento sobre o poromonguetá, baseado em suma na tradição oral que existe fora da região do “aldeamento” e da “terra da santa”, ou seja, como categoricamente, nós [6] é preconceituado na literatura indígena sobre o povo Tremembé, os de fora [7].
Retomando a questão da trajetória da língua Tremembé, para alguns autores (Pompeu Sobrinho, 1951; Seraine, 1955 e Nimuendaju, 1981) a língua nativa dos Tremembé pertenceria a alguma família linguística especifica no passado, ou seja, no período pré-cabralino onde;

Aryon Rodrigues [...] chama a atenção (no artigo “Descripción del tupinambá en el período colonial: el arte de Anchieta), para o fato de que Fernão Cardim, em 1584, mencionou 68 idiomas distintos do Tupinambá numa área que corresponde aproximadamente aos atuais Estados de Sergipe, Bahia, Espírito Santo e Rio de Janeiro. [...]. (RODRIGUES, 1993, p.07)

Provavelmente este número deveria ser maior, mediante a estimativa antropológica e histórica indicada no início deste artigo e é, razoavelmente possível, que a língua nativa falada dos Tremembé esteja entre estas. Suposições realizadas pelos escritos de D’Evreux (2002) datado de 1615 aponta hostilidade entre os grupos falantes do tupi com o povo Tremembé, colocando-os como inimigos ferrenhos. A hostilidade entre grupos étnicos não implica necessariamente afastamento linguístico, já que Seraine (1955) aponta em seus estudos, características peculiar no léxico do Torém como sendo oriundos do Tupi ou da Língua Geral. 
A incerteza é compreensiva visto que o poromonguetá corresponderia a uma vertente do tupi, distinta e mesmo ainda próximo da Língua Geral, sendo esta em via de expansão para o interior do país, chegando e firmando como língua de comunicação stand-up da região (nheengatu) falado pelos missionários, bandeirantes, viajantes, comerciantes e por grupos dos mais diversos troncos e famílias linguísticas testamente alheias ao tronco tupi, no alto Rio Negro, no estado do Amazonas.
Outra suposição a nível popular [8] foi a de que fossemos falante de uma língua oriunda do tronco macro Gê. Entretanto documentação e estudos geolinguístico demostram que:
Desde o Paraguasú e rio São Francisco até ao Itapucurú, talvez até ao Gurupi, encontravam-se disseminados os Quiriris ou Cariris, quando os Portugueses começaram a ocupar o Norte e Nordeste do Brasil. Da tradição conservada pelos missionários infere-se que vieram da parte do Norte, de um lago encantado, que bem pode ser o Amazonas – sugere Capistrano de Abreu; descendo pelos Tupiniquins, depois pelos Tupinambas, que teriam acossado para o interior, rumo de Oeste.

“etnograficamente, distinguiam-se os Quiriris dos povos vizinho pela agricultura mais desenvolvida embora em grau inferior a dos Tupis [...] sabe-se que dali só retiraram quando forçados por adversários mais poderosos.” (MAMIANI, 1679, XX)



Mapa da região falada pelos grupos indígenas do tronco Macro Jê

A língua Brasílica era tão grande que mesmo os grupos falante do kiriri da região nordeste das capitanias falavam-na dificultando a localização e da etnia por parte dos estudiosos como Van D. Dai a suposta “aparentação” dos Tremembé com os Kariri.
Segundo o tupinólogo Eduardo de Almeida Navarro, na introdução de seu Curso de Língua Geral (2011) afirma que

A língua tupi de São Vicente, a de Pernambuco (gramaticalizada pelo padre Luis Figueira) e a do maranhão tinha algumas diferenças com relação ao tupi que Anchieta gramaticalizou [...] há indícios que tenha havido uma língua geral também na costa do Brasil com efeito, o próprio Gregório de Matos disse em seus versos: “há cousa como ver um paiaiá / Mui prezado de ser Camamuru / Descendente de sangue de Tatu / Cujo torpe idioma é Cobepá?” copebá é corruptela de ereicobépe? (passas bem?), na forma de cumprimentos em tupi antigo (Catecismo de Antonio de Araújo, 1618, p. 54). Ora, se os índios paiaiás, que não eram tupis, diziam isso, é porque também houve língua geral na Bahia. (NAVARRO, 2011, p.6)

Pelo trecho de Navarro (como de outros historiadores inclusive do próprio Padre Anchieta) é possível deduzir que existiam várias línguas gerais espalhadas pela costa brasileira, inclusive maranhão (de onde nós Tremembé também habitávamos). O Estado do Maranhão, conforme ainda Navarro,

A língua geral amazônica não foi língua de nenhum grupo indígena antes da chegada dos europeus a América. Ela começou a se formar no Maranhão e no Pará da língua falada pelos tupinambás que ali estava e que foram aldeados pelos missionários jesuítas, juntamente com outros índios de outras etnias e de outras línguas. (grifo nosso) (apud Navarro)

Segundo Alegre,

Apesar de falarem apenas o português, os Tremembé guardam resquícios da língua nativa e mantém uma notória diversidade no falar, figuras de linguagem próprias e diferenças no uso da fonética, em relação à população regional. Os cânticos do Torém contém  muitas palavras do antigo idioma dos   Tremembé misturadas a vocábulos de origem Tupi (Pompeu Sobrinho, 1951; Seraine, 1955; Pinto, 1975). Por meio da música e da coreografia, o Torém ritualiza as relações dos ancestrais com os animais e as plantas, tendo se tornado o símbolo político da afirmação étnica dos Tremembé contemporâneos (Oliveira Júnior, 1998). (ALEGRE, 2000, p.14)

Artigo em construção [...]

Notas:
[1] Interessante essa informação, pois existem hipóteses, no senso comum, que a língua dos Tremembé fosse do tronco Gê, o que se descarta posteriormente com Meatrux.

[2] O poromonguetá foi uma variação dialetal derivada de uma das línguas tupi faladas na costa do nordeste, uma língua geral, diferentemente da língua geral falada na região sudeste e, posteriormente, na região norte do Brasil devido a migração indígena e dos bandeirantes. Entraremos em detalhes posteriormente.

[3]Adiante veremos como a terminologia poromonguetá foi usado em contraposição a terminologia pejorativa de tapuias dadas aos não falantes do tronco tupi.

[4] (Tomás, 1981; Nimuendaju, 1981; Metraux, 1945; Pompeu Sobrinho, 1951).

[5] Estudos Linguísticos Preliminar: O Poromonguetá Do Torém. Arquivo pessoal. Disponibilizei uma prévia  no meu blog: www.xembae.blogspot.com, lá também encontrarão mais postagens sobre o meu povo e sobre o poromonguetá.

[6] Ao emprego do Nós refiro-me, em termo de desabafo, aos Tremembé, como eu, que não nasceram e nem se criaram na TIT (Terras Indígenas Tremembé) embora meus pais sejam nativos de Jericoacoara e meus avós e bisavôs nativos da região de Acaraú e Itapipoca, considero-me e sou Tremembé, de sangue, cultural e socialmente, e não um descendente. Há muitos Tremembé espalhados ao longo da costa norte do nordeste, interiores, tais como em Bitupitá, Camocim, Meruoca, Tatajuba, bem como no Estado do Maranhão, entre outros que ainda não assumiram a identidade, mas que preservam muitos aspectos então desconhecidos da nossa cultura Tremembé, somando positivamente ao nosso povo, como as informações sobre o poromonguetá que coletei, na minha adolescência sem saber do que realmente se tratava, e antes da minha formação antropológica.

[7] Aqui abro um parêntese reflexivo: no artigo de Maria Sylvia Porto Alegre (2000) intitulado Evocações da terra tirada Memória social e consciência política na tradição oral do índios Tremembé, apresentado ao XXIV Encontro Anual da ANPOCS. Página 12, na nota de rodapé diz seguinte: Os relatos que coletamos confirmam os encontrados anteriormente por Valle (1993), quando diz:  "É certo que a gente de fora representa todos aqueles que não são de dentro do Aldeamento. Isso significa também, segundo os Tremembé, que não nasceram ou se criaram na Terra da Santa, no território étnico. Pode-se dizer também que não são filhos naturais de Almofala. Essas categorias e expressões operam no sentido de qualificação étnica, evidentemente. A gente de fora não pode se achar ou ser considerada como índia, afinal não é filho da Terra de Almofala".

[8] Na região de Itapipoca e proximidades, os tremembé mais jovens acreditam que nós éramos falantes de uma “língua chamado de macro jê”, a própria terminologia mostra a necessidade de esclarecimento linguísticos sobre definição de língua, tronco e família linguística. 


Referencias

ALEGRE, Maria Sylvia Porto. Evocações da terra tirada Memória social e consciência política na tradição oral dos índios Tremembé. XXIV Encontro Anual da ANPOCS. GT Biografia e memória social. Universidade Federal do Ceará. Petrópolis - Rio de Janeiro. 23 a 27 de outubro de 2000.
BARROS, Maria Cândida Drumond; BORGES, Luiz C.; MEIRA, Márcio. A língua geral como identidade construída. Revista de Antropologia, São Paulo, 1996. v. 39, n. 1, p. 191-219.
Homo brasilis, organizado por Sérgio D. J. Pena, FUNPEC - Editora, SP. 2002. As Línguas Indígenas e a Pré-História* Denny Moore1 e Luciana Storto.
LÍNGUAS INDÍGENAS DO BRASIL NO LIMIAR DO SÉCULO XXI. LUCY SEKI. impulso nº 27,233 a 256.
MAMIANI, Luiz Vincencio. 1942 [1698]. Catecismo da Doutrina Christãa na Lingua Brasilica da Nação Kiriri. Lisboa. (Edição fac-similar, Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional).
NAVARRO, Eduardo de Almeida. Curso de Língua Geral. (nheengatu ou tupi moderno): A língua das origens da civilização amazônica. 1ª edição. São Paulo. 2011.
OLIVEIRA JUNIOR, Gerson Augusto de. Torém:Brincadeira dos índios velhos.São  Paulo.  Annablume: Fortaleza: Secretaria da Cultura e desporto, 1998.
RODRIGUES, Aryon Dall’Igna. Línguas indígenas: 500 anos de descobertas e perdas. D.E.L.T.A, São Paulo, 1993. v. 9, n. 1, p. 83-103.
SEMANA DOS POVOS INDÍGENAS/CEARÁ- COMIN. 2004. 

STEWARD, Julian H. (ed.) Handbook of South American IndiansVol. 1: The marginal tribes, p. 573-574. Smithsonian Institution, Bureau of American Ethnology, Bulletin 143 Washington: Government Publishing Office
VALLE, Carlos Guilherme Octaviano do. Compreendendo a dança do torém: Visões de folclore, ritual e tradição entre os Tremembé do Ceará. Revista ANTHROPOLÓGICAS, ano 9, volume 16(2): 187-228 (2005)



O Artigo completo ainda está em estudos.
Também estou organizando um banco de dados sobre o meu povo, um local para servir de base para estudantes, pesquisadores e público em geral. (em breve)

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