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POR UMA ANTROPOLOGIA DO ETHOS: CONTRIBUIÇÕES DE MITO E ETHOS ENTRE OS YANOMAMI DE XITIPAPIWEI NO PANORAMA DA ANTROPOLOGIA BRASILEIRA

POR UMA ANTROPOLOGIA DO ETHOS: CONTRIBUIÇÕES DE

MITO E ETHOS ENTRE OS YANOMAMI DE XITIPAPIWEI NO PANORAMA DA ANTROPOLOGIA BRASILEIRA


Mbo'esara Esaîã Tremembé
Paulo Roberto de Sousa
Msc. Antropologia Social
Universidade Federal do Amazonas


Resumo: Estas breves linhas tratam de uma autocrítica de Sousa a sua obra, como também, se destinam a um melhor entendimento sobre a sua produção antropológica contida na dissertação de mestrado intitulada em Mito e Ethos entre os Yanomami de Xitipapiwei. Sousa realizou um estudo acerca dos mitos yanomami, ao mesmo tampo em que relata sua vivência entre os yanomami do Rio Marauiá. Com uma linha de pensamento pragmática, de cunho antropológico-filosófico, o autor se apóia na Teoria da Racionalidade Comunicativa, de Jürgen Habermas (aproximando-se do pensamento de Luis Cardoso de Oliveira, antropólogo que se utilizou fartamente das teorias pragmáticas de Habermas)para discorrer sobre como o ethos é pensado através dos mitos narrados pelos yanomami.

Palavras chaves: ethos, antropologia, yanomami, teoria da racionalidade comunicativa


DESENVOLVIMENTO E ANÁLISE DA OBRA

A pergunta inicial é: por que escrever sobre uma produção antropológica de um autor desconhecido, cujos leitores provavelmente não ultrapassam o número insignificante de 50 pessoas? Simplesmente porque não repousa na quantidade de leitores que marca uma produção, mas sim, na profundidade, enquanto diálogo estabelecido. Ou a sua contribuição dentro de um panorama mais amplo, isto é, a antropologia brasileira.
A seguir faremos o itinerário traçado por Sousa. A princípio a sua dissertação está dividida em três capítulos. Intitulada Mito e Ethos entre os Yanomamö de Xitipapöwei pretende desenvolver considerações a cerca do ethos yanomami expresso através dos mitos, denominados em língua yanomamde wãno narrados pelos Yanomami no xapono[1] de Xitipapiwei. Os yanomami de Xitipapiwei estão localizados na região do rio Marauiá, no município de Santa Isabel do Rio Negro, ao noroeste do Estado do Amazonas.

Os capítulos estão basicamente organizados do seguinte modo, a saber: CapI: Os Yanomami; Cap II: Definições e Paradigmas e Cap III: Análise dos wãno e o ethos yanomami e por fim a Conclusão.

Veremos um resumo geral de cada capítulo e simultaneamente traçaremos as críticas através da análise dos seus conteúdos.

No Capítulo I, o autor situa o leitor sobre quem são os yanomamö, a família lingüística a qual pertence e localiza-os segundo a sua região. Descreve um pouco sobre alguns aspectos do mundo yanomami, isto é, como eles utilizam do espaço territorial, mostrando os círculos concêntricos nos quais desenvolvem as suas atividades de subsistências. Descreve também as primeiras grandes migrações, que alguns autores denominam como sendo ponto de origens, ou da grane migração, dos yanomami, e que por estes motivos optou por deixar o termo origem no texto. Expõe a construção do etnônimo yanomami, mostrando a visão de alguns estudiosos como Bruce Albert, Jacques Lizot, Casimiro Beksta e a versão dos próprios yanomami, dados que obtidos em diversos momentos da experiência entre estes. Em seguida, descreve um pouco da sua experiência entre os yanomami, narrando como se deu o primeiro contato ocorrido em 2006 nos xaponos yanomami de Maturacá próximo a São Gabriel da Cachoeira. Nesta narração coloca a sua experiência de contato. Logo em seguida narra a ida á Marauiá, onde viria a morar, como e junto com os salesianos, em 2007 com poucas saídas da área. Segundo o autor foi neste período que entrou em contato com os yanomami de vários xapono, e entre eles o de Xitipapiwei ou Pohoroa-centro (como era mais conhecido pelos brancos), pois se encontra a aproximadamente duas horas, a passo yanomami, de Pohoroa, xapono que fica as margens de outro igarapé. Nesta parte o autor narra, de forma etnográfica, um pouco da experiência marcante que foi a convivência entre os yanomami, o aprendizado da língua, os costumes e o ritual osteofágico, onde os yanomami consomem as cinzas de seus mortos em mingau de banana denominado kurata u kë. Depois segue localizando melhor o xapono de Xitipapiwei, lugar onde surgiram os primeiros insight para a realização desta pesquisa, lugar onde pode ouvir os mitos, lugar em que teve um contato mais profundo da dimensão do wãno.
Ainda nesta parte suscita o debate sobre o que significa ‘campo’ na sua pesquisa, além de esclarecer os tipos de dados com os quais trabalhou. Justifica-se, também, porque não fez uso de alguma teoria da Performance, como por exemplo, de Victor Turner, Richard SCHECHNER ou algumas daquelas apontada por MarizaPeirano na dissertação, sendo que esta justificativa apontava para o caráter específico da pesquisa.Isto é, analisar as relações sociais a partir do discurso, onde o conceito de discurso que adota é o conceito de Habermas: procedimento argumentativo com pretensões de validar um determinado consenso. Segundo o autor esta escolha não inviabilizaria a possibilidade de se trabalhar com a Performance, mas entendeu que se fizesse isso, estaria por construir outro tipo de empreendimento, tão significativo e tão importante quanto a que foi realizada. Entretanto, acabou por optar pela via da análise pragmática(a pragmática foi utilizada por outros autores da antropologia) contido na filosofia da linguagem de Habermas.
No Capítulo II, o Sousa tentou delinear as Definições e os Paradigmas utilizados na pesquisa. Esse delineamento tornou-se necessário para contextualizar a pesquisa que teve como ponto de partida a análise de três wãno (narrativa mítica) yanomamiHewëriwë ‘Homem-morcego’, Ira, Opo, Kumararotawë‘Onça, tatu e centopéia’ e Tõmöriyoma ‘Mulher-cutia’. Estes foram escolhidos, segundo o autor, não pelo fato de serem favoráveis às análises que propomos, pois se procedesse assim, como diria Lévi-Strauss (2004) nas Mitológicas I, estes perderiam muito de sua força, mas, a escolha se deu pelo fato deste trio mitológico oferecer uma perspectiva dialética de oposições e correlações que remetem a uma concepção de mundo em três tipos de narrações. Embora essa tenha sido a idéia do autor, acredito que o resultado ficou um tanto malogrado, pois se estendeu demasiadamente em um parte e reduziu-se drasticamente a parte principal, a nosso ver.
Para que sua pesquisa fosse realizável, Sousa optou pela análise pragmática de Habermas, uma vez que a sua concepção de ethos (que está alicerçada em uma ética-discursiva) está postulada na Teoria da Racionalidade Comunicativa [para lembrar o termo ethos foi utilizado por Geertz, por exemplo, na Interpretação das Culturas]. A opção por Habermas, em relação a outros autores que também trabalharam com a linguagem como Wittgenstein, Austin, Bourdieu, entre outros, que são mais correntes na antropologia, repousa, segundo Sousa sobre dois princípios: 1) o fato de Habermas tratar ações comunicativas como relações sociais[comunicação concebida como um processo dialógico, através do qual sujeitos, capazes de linguagem e ação, interagem com fins de obter um entendimento], ações midiatizada pela linguagem [o conceito de linguagem que o autor adota é o mesmo de Habermas, a linguagem semiótica que resguarda a questão da não verbalização e enfatiza a ação verbal como um tipo de ação sociais] e 2) o fato de Habermas representar uma etapa mais desenvolvidas, por assim dizer, das teorias sobre a linguagem dos autores já citados. O desenvolvimento do jogo de linguagem de Wittgenstein e os atos de fala de Austin (muitas vezes citados na literatura antropológica, como em Geertz e Victor Turner) assumem, em Habermas, uma dimensão pragmática de cunho social. Para além de Wittgenstein a linguagem assume não só uma dimensão de relação de significado em um determinado contexto, mas, tanto quanto a função de comunicação, assume também a de representação. Para além de Austin, o ato de fala agora assume a interação intersubjetiva dos sujeitos de forma a estabelecer relações sociais através de falas que se tornam normativa, não mais delineada por conteúdo psicologista como ocorria em Austin. [Habermas recupera, na sua teoria da ação comunicativa, elementos da teoria da linguagem do segundo Wittgenstein e da teoria dos atos de fala de Austin. No primeiro caso, incorpora a tese de que falar é agir socialmente, ou seja, constitui uma forma de vida e de seguimento a regras gestadas socialmente. No segundo caso, assume a tese de que falar coisas significa fazer proferimentos que estabelecem relações sociais. Nesse sentido, a sua teoria ultrapassa a esfera da lingüística e se configura como pragmática].
Se a explanação da análise de Sousa foi malograda pelo pouco espaço concebida a atividade hermenêutico sobre o mito yanomami. Por outro,apresentou um dado importante que provavelmente o fez optar por Habermas.Isto é, o conceito habermaseano de ética possui seus alicerces nas interações comunicativas e não necessariamente nas teorias ontológicas de verdade que define as teorias clássicas dos estudos sobre a ética. Talvez isso tenha sido a grande sacada do autor.A partir daqui a pesquisa de Sousa tentou mostrar a diferença entre os estudos clássicos sobre a ética e a ética discursiva postulada, por sua vez, pela Teoria da Racionalidade Comunicativa. Mostrando que enquanto uma caminha pelas teorias ontológicas da verdade e teorias de correspondências, a outra (ética discursiva) caminha pela construção de um consenso [consenso=consiste na aceitação de uma pretensão de validade de forma intersubjetiva, independentemente das próprias preferências, ou seja, pelas mesmas razões] através do diálogo intersubjetivo [o que está diante de si não é mais um objeto e sim outro sujeito] entre interlocutores que se entendem[2] e que usam um pano de fundo comum, denominado, a partir de Husserl, de mundo da vida. Assim, o autor coloca alguns dos principais conceitos da teoria da racionalidade comunicativa, como por exemplo, mundo-da-vida, pretensões de validade, consenso, ente outros.
Mediante ao que foi exposto ate aqui, Sousa, pretendeu estabelecer uma reflexão a respeito de como o ethos é expresso nos wãno. Ao tratar o mito, no primeiro momento, como proferimentoslingüísticospretendeu, o autor, a remeter as representações yanomami de moralidade subjacentes em cada narração mitológica e com isso, ratificao uso de Habermas, que a linguagem presta-se tanto a comunicação como a representação. Segundo Sousa, o proferimentolingüístico é (conforme Habermas) uma forma de agir que serve ao estabelecimento de relações interpessoais. Em outras palavras, para Sousa,a Racionalidade não é a do conteúdo, mas a do procedimento.
No Capitulo III, o autor parece que entra verdadeiramente no escopo da pesquisa.Expõealgumas considerações importantes a cerca do contexto mitológico yanomami e logo a diante descreve os três wãnoyanomami: Hewëriwë; Ira, Opoe Kumararotawë e Tõmirayoma. Para isso o neo-antropólogo descreve os mitos em língua yanomami e em seguida a sua tradução aproximada em português. Em seguida passa a analisar os wãno. Suscita e responde as principais críticas que cerca o tipo de análise a que se propõe.Isto é, o de utilizar a Teoria da Racionalidade Comunicativa para analisar o ethosyanomami através dos mitos. A crítica consiste na afirmação de que a teoria da racionalidade comunicativa, sendo uma teoria nos parâmetros da modernidade, não seria viável sua utilização para uma análise de povos de caráter tradicional, como os yanomami. A esta crítica, Sousa responde com Bruno Latour, a qual demonstra, através dos híbridos, que os fundamentos que separa o pensamento moderno e o não moderno, ou pré-moderno, não se sustenta. Deste debate de Latour entre pré-moderno e moderno, percebemos que é ilusão pensar em racionalidade como um fator exclusivamente ocidental e que, portanto, não se sustenta a idéia de excluir sociedades não-ocidentais de análises teóricas interpretadas como modernas. Desta forma, Latouroferece a Sousa uma base e um espaço para prosseguir com o desenvolvimento da sua pesquisa.
Pelo que podemos perceber, a análise dos wãno a partir da racionalidade comunicativa repousa no fato da comunicação entre os yanomami oferecer, como diria Habermas, raízes de racionalidade, além de que toda ação comunicativa, para ele, revela complexos processo racionais. Partindo desse pressuposto levou-se em consideração três dimensões: 1- Wãno: o que é dito na expressão lingüística. 2- Wãno: aquilo que se pretende dizer com uma expressão lingüística. 3- Wãno: a forma como é utilizada no ato da fala. Passou então o autor, para a racionalidade comunicativa na construção do ethos. Ora, se Habermas afirma que o uso comunicativo de expressões lingüísticas não serve apenas para exprimir intenções de um falante, mas também para representar estados de coisas (ou supor sua existência) e estabelecer relações interpessoais com uma segunda pessoa. (Habermas, 2004,107), então podemos dizer que existe uma relação tripartite entre a significação de uma expressão e:
·         O que se quer dizer com ela; O narrador de Hewëriwë pretende estabelecer uma relação interpessoal com seus interlocutores;
·         O que se diz nela; Sobre as conseqüências do rompimento da norma social, mas do que do tabu em si;
·         E a forma de sua aplicação na ação dela; O narrador se utiliza de universais pragmáticos em proferimentoslingüísticos, já que em seu ato de fala persegue uma meta locucionária.
Para concluir, Sousa mostra que o narrador yanomamö, ao orientar o mito para o entendimento, cria através de sua ação um contexto de vida socialmente reconhecido, produzindo neste objeto simbólico a forma de uma estrutura de conhecimento pré-teórico, aqui sob a forma da configuração do sistema social yanomami. Ao se comunicarem através do wãno, tendo em vista a racionalidade comunicativa, os interlocutores estipulam uma ética-discursiva fundada no consenso.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar do grande esforço intelectual que foi feito para a realização de sua pesquisa, as lacunas parecem cientes a Sousa. Lacunas de ordem metodológicas e teóricas, que a sua pesquisa apresenta. Que vai desde a simples e não menosimportante revisão ortográfica, como a de rever alguns conceitos que não ficaram necessariamente claros, ou que deveriam ser mais explorados, desenvolvidos e explanados. Provavelmente por não trazer mais autores da antropologia para dentro do seu diálogo, proposto em Mito e Ethos entre os Yanomami de Xitipapiwei, ficamos a espera de que alguma coisa faltou para a conclusão de sua pesquisa. Habermas é um autor difícil de se dialogar (as vezes mal entendido como afirmou Viveiros de Castro em Filiação Intensiva e Aliança Demoníaca), mas não impossível, como já nos mostram antropólogos como Luis e Roberto Cardoso de Oliveira ao utilizarem Habermas na sua produção antropológica.
Felizmente, apesar do malogrado uso da teoria de Habermas, a pesquisa de Sousa é salvaguarda, não tanto pela teorização que trouxe no seu exercício intelectual (sem dúvida também por certo caráter de inovação, ou seria melhor contribuição?), mas pela descrição de cunho etnográfico do primeiro capitulo de sua obra. A crítica que operamos a Sousa não se trata de antipatia pelo diálogo com a filosofia contemporânea de Habermas, pois sabemos que há muito para ser desenvolvido napesquisa deste neófito na antropologia. Isto é, detalhes que passaram desapercebidos, ou de aprofundar mais os termos utilizado pelos yanomami em sua própria língua, que apesar do esforço feito, não foram suficientemente desenvolvidos. Por outro lado, apesar de tantas lacunas, pedimos compreensão, pois, o espaço de dois anos é demasiadamente curto quando o objetivo do mestrando, apesar de que, no quadro geral, não é este: o de renovar a antropologia ou de suscitar teorias e grandes dilemas. Mas o de preparar para uma próxima etapa, mais exigente e mais profícua, o amadurecimento do pensamento antropológico. Isso não impede, todavia, de que as dissertações de mestrado em antropologia venha à contribuir com uma parcela mínima ao enriquecimento do pensamento antropológico, referindo principalmente na antropologia produzida no nosso Estado do Amazonas e dentro do quadro antropológico brasileiro. Quer seja pelo desafio de suscitar novas temáticas, quer seja de ampliar os horizontes antropológicos dialogando com novos (talvez, não tão novos assim) autores de outras áreas do conhecimento.







[1]Xapono significa o conjunto de casas distribuídas, mais comumente, em círculos.
[2] Só para lembrar [entendimento = consiste na aceitação de uma declaração com base em razões que sejam boas para o declarante, mas que não são boas para quem a aceita, à luz de suas próprias preferências. O ouvinte não faz suas as razões do falante, não adota como próprias essas razões, mas por uma espécie de voto de confiança nas razões apresentada adota-a temporariamente. A certeza de uma determinada ação normativa (certezas de ações abaladas, p. 182) fica então aberta para o processo discursivo].

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